Obesidade e Câncer: Existe Relação? O Que os Estudos Mostram

obesidade e câncer

A obesidade é amplamente reconhecida como uma condição crônica associada a uma série de problemas de saúde, como diabetes tipo 2, hipertensão e doenças cardiovasculares. No entanto, uma de suas consequências mais graves e menos discutidas pela população em geral é sua forte associação com o aumento do risco de desenvolvimento de diversos tipos de câncer. Enquanto a ligação entre o tabagismo e o câncer é universalmente conhecida, a ciência moderna posiciona a obesidade como o segundo maior fator de risco evitável para a doença, atrás apenas do cigarro.

Por muito tempo, o excesso de peso foi visto primariamente como uma questão estética ou de disposição. Hoje, a evidência científica é inequívoca e alarmante. O tecido adiposo (gordura corporal) não é inerte; ele é metabolicamente ativo e, quando em excesso, desencadeia uma cascata de processos biológicos que criam um ambiente propício para o surgimento e a proliferação de células cancerígenas.

Neste artigo vamos desvendar por que o excesso de gordura corporal é tão perigoso, quais tipos de câncer estão mais associados a essa condição e como a perda de peso, incluindo o tratamento cirúrgico da obesidade, representa uma das mais importantes estratégias de prevenção disponíveis atualmente.

Os Mecanismos Biológicos: Como a Obesidade Alimenta o Câncer

A relação entre obesidade e câncer não é uma mera coincidência estatística. Ela é sustentada por mecanismos biológicos complexos e interligados. O excesso de tecido adiposo, especialmente a gordura visceral que se acumula ao redor dos órgãos, funciona como uma verdadeira “fábrica” de substâncias que promovem o crescimento tumoral.

Os principais mecanismos identificados pela ciência são:

  1. Inflamação Crônica de Baixo Grau: A obesidade gera um estado de inflamação persistente no corpo. As células de gordura liberam citocinas inflamatórias, que, em excesso, podem causar danos ao DNA das células saudáveis. Esse dano celular contínuo aumenta a probabilidade de mutações que dão origem ao câncer.
  2. Aumento dos Níveis de Insulina e Fatores de Crescimento (IGF-1): Pessoas com obesidade frequentemente desenvolvem resistência à insulina, o que leva o pâncreas a produzir mais desse hormônio. Níveis elevados de insulina e do Fator de Crescimento semelhante à Insulina tipo 1 (IGF-1) atuam como “fertilizantes” para as células, estimulando sua proliferação descontrolada e inibindo a apoptose (morte celular programada), um mecanismo natural de defesa do corpo contra células defeituosas.
  3. Produção Excessiva de Hormônios (Estrogênio): Após a menopausa, o tecido adiposo se torna a principal fonte de produção de estrogênio no corpo da mulher. Níveis elevados e crônicos deste hormônio estão diretamente ligados ao aumento do risco de cânceres hormônio-dependentes, como o de mama, endométrio e ovário.
  4. Alterações nas Adipocinas: As células de gordura produzem hormônios chamados adipocinas, como a leptina e a adiponectina. Na obesidade, os níveis de leptina (que promove o crescimento celular) aumentam, enquanto os de adiponectina (que tem efeito protetor e anti-inflamatório) diminuem, criando um desequilíbrio que favorece o desenvolvimento do câncer.

Quais Tipos de Câncer Estão Ligados à Obesidade?

A evidência científica é robusta e crescente. Instituições como o Instituto Nacional de Câncer (INCA) e a American Cancer Society listam pelo menos 13 tipos de câncer com forte associação com o sobrepeso e a obesidade:

  • Câncer de Mama (em mulheres na pós-menopausa): O risco aumenta significativamente devido à maior produção de estrogênio pelo tecido adiposo.
  • Câncer Colorretal: A inflamação crônica e os altos níveis de insulina são fatores-chave.
  • Câncer de Endométrio (revestimento do útero): Um dos cânceres com a mais forte ligação com a obesidade, também devido aos níveis elevados de estrogênio.
  • Câncer de Esôfago (adenocarcinoma): A obesidade é um fator de risco para o refluxo gastroesofágico, que pode levar a uma condição pré-cancerosa chamada Esôfago de Barrett.
  • Câncer de Rim: A inflamação e os desequilíbrios hormonais contribuem para o risco.
  • Câncer de Pâncreas: Associado à resistência à insulina e à inflamação crônica.
  • Câncer de Fígado: A obesidade pode causar a Doença Hepática Gordurosa Não Alcoólica, que pode progredir para cirrose e câncer.
  • Outros tipos incluem: Câncer de vesícula biliar, estômago (cárdia), ovário, tireoide, mieloma múltiplo e meningioma.

Os números são alarmantes. De acordo com o INCA, estima-se que um em cada vinte casos de câncer no Brasil possa ser atribuído ao excesso de peso. Isso se traduz em milhares de casos que poderiam ser evitados anualmente.

A Perda de Peso Como Estratégia de Prevenção e Tratamento

Se a obesidade aumenta o risco de câncer, a perda de peso pode reduzi-lo? A resposta da comunidade científica é um sonoro sim. A perda de peso intencional e sustentada não é apenas uma medida preventiva, mas também pode melhorar o prognóstico de pacientes já diagnosticados.

Ao perder peso, os mecanismos que ligam a obesidade ao câncer começam a ser revertidos:

  • Os níveis de inflamação no corpo diminuem.
  • A sensibilidade à insulina melhora, reduzindo os níveis de insulina e IGF-1.
  • A produção de hormônios, como o estrogênio, é normalizada.
  • O equilíbrio das adipocinas é restaurado.

Para indivíduos com obesidade grave, alcançar e manter uma perda de peso significativa apenas com dieta e exercícios pode ser um desafio monumental. É neste cenário que a cirurgia bariátrica se destaca como a intervenção mais eficaz. Um estudo acompanhou mais de 30.000 pacientes e concluiu que a cirurgia bariátrica foi associada a uma redução de 32% na incidência de câncer e uma impressionante redução de 48% na mortalidade relacionada ao câncer.

Essa evidência robusta posiciona o tratamento cirúrgico da obesidade não apenas como um procedimento para perda de peso, mas como uma cirurgia com profundo impacto oncológico preventivo.

Conclusão: Um Fator de Risco que Podemos Controlar

A relação entre obesidade e câncer é uma realidade científica inegável, com implicações diretas para a saúde pública e para a vida de milhões de pessoas. O excesso de peso não é um espectador passivo; ele ativamente cria um ambiente corporal que favorece o surgimento e o desenvolvimento de tumores malignos.

A boa notícia é que, diferente de fatores de risco genéticos, a obesidade é modificável. A decisão de buscar um peso saudável através de mudanças no estilo de vida e, quando indicado, de tratamentos médicos ou cirúrgicos, é uma das ações mais poderosas que um indivíduo pode tomar para reduzir seu risco de desenvolver câncer. Proteger-se contra o câncer vai muito além de exames de rotina; começa com as escolhas diárias que fazemos pela nossa saúde.

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